quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Estadão: bancos tentam negociar regras para o setor de cartões de crédito

O Estado de São Paulo
Adriana Fernandes, Fabio Graner e Isabel Sobral, BRASÍLIA


A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) pressiona o governo para frear a tentativa da área técnica do Banco Central e do Ministério da Fazenda de fazer uma regulamentação mais intervencionista para o setor de cartões de crédito. Insatisfeitos com a forma como a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) conduziu o processo até agora, os presidentes dos quatro maiores bancos privados do País partiram para negociações diretas com o governo.

O diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça, Ricardo Morishita, já se reuniu com o presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setubal. Outras reuniões devem ocorrer com os presidentes do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, do HSBC, Conrado Engel, e do Santander, Fabio Barbosa, segundo confirmaram à Agência Estado duas fontes envolvidas nas discussões. As reuniões são intermediadas pela Febraban, de quem partiu o convite para conversas em separado.

A Febraban, de acordo com um porta-voz da entidade, nega oficialmente que esteja articulando ou tenha conhecimento dos encontros. Morishita, no entanto, confirma que esteve com Setubal e tem encontros marcados com outros banqueiros.

A maior preocupação dos banqueiros é evitar que o governo proponha o fim da "verticalização" do setor, modelo de negócios pelo qual as empresas de cartão de crédito controlam todo o processo: credenciamento de lojistas, fornecimento de terminais de pagamento, captura e processamento de transações, compensação e liquidação das operações. Uma opção nessa direção provocaria mudanças societárias nas empresas, com divisão de negócios e provável perda de rentabilidade. Os técnicos do governo relutam em falar do tema, por causa do risco de impacto dessa informação nos preços das ações da Redecard e Visanet.

O tema é tão explosivo que dirigentes da Febraban têm feito reuniões periódicas para discutir o problema. O presidente da entidade, Fabio Barbosa, se reuniu por mais de uma vez com o presidente do BC, Henrique Meirelles, para tratar da proposta em estudo. Meirelles, segundo uma fonte, se comprometeu "a olhar de perto" o assunto.

Mas o BC está dividido. Enquanto os técnicos resistem a medidas brandas e querem avançar na regulação, o comando da instituição dá sinais de trabalhar para um modelo mais suave, alinhado com a tese da autorregulação. Uma proposta de lei feita pela área técnica do BC, com medidas mais duras de intervenção, já está pronta, à espera de uma decisão política.

Há pelo menos quatro anos, técnicos tentam, sem sucesso, mudar as práticas do setor. O chefe do Departamento de Operações Bancárias (Deban), José Antônio Marciano,vem alertando as empresas a fazer mudanças. O clima de tensão aumentou quando Marciano disse que não negociaria mais com a Abecs. A assessoria do BC diz que Marciano, que está em férias, nega ter encerrado negociações com a entidade.

Uma fonte do governo reconheceu a dificuldade de discutir com a Abecs, pois ela congrega tanto grandes empresas que dominam o mercado (Redecard e Visanet), como as pequenas, tentando se equilibrar entre os dois grupos.

Em troca de uma atitude mais branda do governo, os bancos estariam dispostos a promover avanços significativos para os consumidores. De qualquer forma, os técnicos do governo não estão dispostos a deixar o setor se autorregular, mas mostram a preocupação de buscar soluções que beneficiem consumidores e lojistas, sem inviabilizar o negócio.

Uma das medidas que o governo pretende colocar na legislação é a definição de prazo para mudanças contratuais nas relações entre administradoras de cartão e lojistas. Hoje não há regra e, por isso, as empresas de cartão podem mudar o contrato a qualquer momento. Isso prejudica os pequenos lojistas, mas a medida é interpretada como um freio na atuação do setor.

O problema com as discussões sobre o setor é que ainda não há definições de caráter político. Como três pastas do governo trabalham no assunto, será preciso que seus comandantes sentem e definam o que será ou não adotado.

Por enquanto, só o presidente do BC, Henrique Meirelles, se mostra nos bastidores interessado no tema, tratando do assunto com o presidente da Febraban, Fabio Barbosa. Ao contrário da regulamentação das tarifas bancárias, quando pressionou os bancos, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda não se posicionou.

Fonte: O Estado de São Paulo

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