quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Banco Central impõe barreira à compra de instituições financeiras por fundos

Valor Econômico
Carolina Mandl

As cifras bilionárias que os fundos de "private equity" possuem para investir em empresas no Brasil têm encontrado barreiras em um setor: o financeiro. Preocupado com a solidez do sistema, o Banco Central tem adotado uma postura bastante cautelosa na aprovação de compras de bancos e corretoras por fundos de private equity, o que tem barrado algumas operações.

Segundo o Valor apurou, no fim do ano passado, depois de dois anos à espera do sinal verde do Banco Central, a gestora de fundos de private equity Advent desistiu de adquirir o controle do braço financeiro da varejista gaúcha Quero-Quero. Reformulou o acordo com o ex-controlador, que permaneceu à frente do negócio financeiro. O fundo ficou com uma participação elevada nos lucros em cima dos produtos financeiros vendidos nas lojas de sua propriedade.

Nos últimos tempos, a autoridade tem recebido diversas consultas de fundos de private equity interessados no setor financeiro. Os gestores querem sondar a receptividade do BC a suas investidas. Neste momento, pelo menos duas operações estão sendo avaliadas. Uma delas é a aquisição de uma fatia minoritária da corretora XP Investimentos pelo fundo inglês Actis.

A entrada de um fundo de investimento em participações no banco BVA também é apreciada. Outra transação que pode cair no radar do governo, caso venha a ser concretizada, é a compra do Banco Geração pelos fundos da Tarpon.

Além disso, o banco Gerador também andou sendo sondado por alguns fundos estrangeiros, mas a operação não caminhou depois de investidores concluírem que havia risco de o negócio não passar pelo crivo do governo.

Os dirigentes do Banco Central têm deixado claro aos gestores que a instituição não é contrária à entrada pura e simples dos fundos porque a chegada de mais capital pode elevar a competitividade do setor, o que seria uma boa notícia. A autoridade afirma a interlocutores que não ficará alheia à liquidez do mercado internacional, que quer despejar recursos nos países emergentes, mas que isso não significa que qualquer capital será bem-vindo. Um indício de que a entrada dos private equities não é vetada em todos os casos é que em 2006 o governo deu o sinal verde para o fundo TPG Axion deter 45,3% da companhia hipotecária Brazilian Mortgages, do grupo Brazilian Finance & Real Estate.

A principal preocupação manifestada pelo BC é em relação à origem dos recursos. Fundos de private equity não possuem donos, apenas diversos cotistas que fazem um investimento financeiro. A pergunta que surge é: quem vai ser responsabilizado em um cenário de quebra de uma instituição? As regras do sistema financeiro no Brasil exigem que o controlador de uma instituição financeira responda pessoalmente com seus bens em caso de algum problema.

Em muitos casos, quem detém a cota do private equity é um fundo de pensão, que paga benefícios a milhões de aposentados, por exemplo. Também há a preocupação em conhecer a idoneidade dos cotistas do fundo. Checa-se, por exemplo, se não há lavagem de dinheiro por parte dos investidores por trás da aplicação. Para o Banco Central, apesar de o gestor ser responsável pela administração dos investimentos, ele não poderia ser culpado por eventuais prejuízos, já que o dinheiro investido não é dele.

Diversos fatores entram na análise do Banco Central. O ponto que mais demanda atenção da autoridade são os casos que envolvem a compra de controle de instituições financeiras. Participações inferiores a 5% são as que menos requerem preocupação, tanto que diversos fundos compraram ações de instituições que fizeram ofertas iniciais de ações nos últimos anos. Ou seja, o grau de análise do governo será mais detalhado quanto maior for a fatia que o fundo tiver.

Outra variável que acentua a investigação do Banco Central é o tipo de instituição financeira que receberá o aporte dos fundos. Menores exigências, por exemplo, são feitas no caso de corretoras. No caso de bancos, que captam recursos de correntistas de varejo, a preocupação é maior. Isso já está implícito no volume de capital mínimo normalmente exigido para a constituição de cada uma dessas instituições. Uma corretora de câmbio demanda R$ 300 mil, enquanto um banco requer R$ 51 milhões.

Além disso, preocupa o Banco Central o fato de os fundos de private equity terem um período pré-determinado para realizar lucros por meio da venda de suas participações nas empresas. A presença deles em empresas é datada, sem o tradicional perfil mais perene das atuais instituições financeiras no Brasil, que são em geral controladas por famílias ou por instituições internacionais com tradição no setor bancário. Como ficará a instituição depois da saída dos investidores? Quem assumirá o banco depois? Essas são algumas incertezas que rondam esse tipo de operação.

Procurado pela reportagem, o Banco Central afirmou por meio de uma nota que "analisa os casos individualmente e leva em conta as particularidades de cada investidor".

Em outros países, muitas vezes os fundos de private equity não encontram restrições por parte dos reguladores. No Uruguai, o Advent comprou o controle do Nuevo Banco Comercial, o maior banco comercial do país, em 2006.

Muito empolgados com o setor financeiro no Brasil, a saída que os fundos estão encontrando para botar o pé nessa área é adquirir serviços paralelos ou complementares aos prestados por instituições financeiras. É o caso das plataformas de negociações de ativos, como a Cetip, que tem como sócio o Advent, e a BM&FBovespa, com o General Atlantic. Recentemente, dois fundos de private equity também demonstraram interesse pela companhia de securitização imobiliária Cibrasec

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